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Rio de Janeiro, RJ, Brazil
Cláudia Andréa Prata Ferreira é Professora Titular de Literaturas Hebraica e Judaica e Cultura Judaica - do Setor de Língua e Literatura Hebraicas do Departamento de Letras Orientais e Eslavas da Faculdade de Letras da UFRJ.

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segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Bíblia Hebraica e Língua Hebraica

A Bíblia Hebraica e a História da Língua Hebraica[1]


A questão da datação dos textos bíblicos se relaciona à história da língua hebraica por duas vertentes: por um lado, as características gramaticais e semânticas dos textos ajudam a datá-los; por outro, os fatos descritos nos textos e os elementos míticos que os compõem, funcionando como indicativos sobre a época provável de sua redação, colaboram para que se estabeleça uma datação da formação e da evolução do idioma hebraico. Quando dizemos que o hebraico bíblico divide-se em três períodos — arcaico, Primeiro Templo e Segundo Templo —, estamos utilizando períodos que têm por base fatos descritos na Bíblia. Mas, quando se afirma que o Livro de Daniel é do século II a.E.C., é a partir do uso intenso do aramaico que se pode estabelecer tal datação.

O tema ela datação dos livros da Bíblia Hebraica se refer tanto à formação e à transformação do hebraico antigo como do moderno. Um dos aspectos relevantes no estudo de um discurso poético é a construção de um parâmetro comparativo em relação ao discurso usual. Paralelamente, o conhecimento do contexto histórico e pessoal do autor pode ser útil para entender o processo de construção poética. Embora a poesia hebraica clássica tivesse regras claras, que já foram estudadas pela crítica bíblica, tais como a.repetição (simples, por sinonímia e por antinomia), muitos textos da Bíblia Hebraica que não podem ser formalmente considerados poesia apresentam, do ponto de vista da densidade do significado, uma função poética. A compreensão da “história da redação dos textos” pode ser um útil instrumento para uma leitura mais apropriada destes quando se busca separar o uso poético de outras funções da linguagem. Isso pode evitar armadilhas como as que tantas vezes enganaram os estudiosos da Bíblia, que viam imagens Figuradas em descrições de fatos corriqueiros, cømo mais tarde se pôde descobrir por meio da arqueologia.

É importante traçar um “elo operacional” entre o estudo das transformações sofridas pela língua hebraica e a abordagem semiológica do estudo da Bíblia. A questão de datação dos textos bíblicos, a partir do estudo de algumas teorias já conhecidas, pode fornecer subsídios para compreender o contexto de sua redação.

É preciso levar em conta que, no que se refere à datação, ainda está longe de um consenso, embora alguns princípios gerais norteadores, como a teoria das fontes, já tenham sido aceitos por quase todos os estudiosos da Bíblia (no âmbito da ciência e da universidade, naturalmente e, em alguns casos, mesmo no âmbito da religião). Apesar dos grandes progressos realizados pelas escavações arqueológicas em Israel e em algumas partes do Oriente Médio nas últimas décadas, há um longo caminho a ser trilhado até que se possa conhecer com maior exatidão quando foram escritos os textos bíblicos. Essa dificuldade é certamente maior em vista das camadas redacionais que a maioria deles possuiu, ou seja, compilamentos e acréscimos posteriores à redação original, e também por causa dos problemas em identificar o autor ou autores de cada livro ou camada redacional. Não obstante, é preciso reconhecer que muito se progrediu, que já não estamos totalmente às escuras e podemos, com alguma precisão, situar as datas de redação dos livros da Bíblia Hebraica.

A pretensão aqui não é a de chegar a posições conclusivas com respeito a datações dos textos bíblicos... [...] Trata-se apenas de um levantamento, ainda que não suficientemente extenso ou profundo, sobre algumas teorias e orientações aceitas pelo mundo científico que permitem uma reflexão sobre a construção histórica dos significados, aspecto fundamental na questão da releitura da obra aberta.


Texto hebraico bíblico e a língua hebraica Observamos que na Bíblia Hebraica, a língua hebraica sofreu mudanças ao longo de aproximadamente mil anos em que provavelmente foram escritos os livros que dela fazem parte. Os estudos lingüísticos permitiram uma datação mais correta dos livros da Bíblia Hebraica, embora também se continue recorrendo à pesquisa histórica.



O conceito de “hebraico bíblico” não deixa de ser uma ficção [...]. Os textos bíblicos refletem um milênio inteiro de desenvolvimento lingüístico, pelo que não pode deixar de refletir hebraicos diferentes e de terem incorporado diversos dialetos. As diferenças dialetais entre o hebraico de Judá no Sul e o de Israel no Norte remontam a dialetos cananeus do segundo milênio a.C. (TREBOLLE BARRERA).[2]


Aprofundando o estudo


BEREZIN, Rifka. As origens do léxico do hebraico moderno. São Paulo: EDUSP, 1980.

FRANCISCO, Edson de Faria. Características da língua hebraica: Hebraico Arcaico, Hebraico Pré e Pós-Exílico, Hebraico de Qumran e Hebraico Massorético. IN: Estudos de Religião 21. Práxis Religiosas e Religião. Ano XV, Número 21, dezembro de 2001, São Bernardo do Campo, São Paulo: UMESP. p.165-195.

HADAS-LEBEL, Mireille. L´Hebreu: 3000 ans d´histoire. Paris: Albin Michel, 1992.

LANGER, Eliana Rosa. Ressurgimento da Língua Hebraica e suas implicações culturais. IN: Revista de Estudos Orientais. Revista do Departamento de Línguas Orientais da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas/USP. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, 1998. N.2. p.63-76.

LIMA, Maria de Lourdes Corrêa. A contribuição da lingüística textual para a compreensão dos valores do verbo hebraico: algumas considerações. Atualidade Teológica. Revista Semestral do Departamento de Teologia da PUC-Rio. Rio de Janeiro: PUC-Rio, Ano V, número 9, julho/dezembro de 2001. p.229-239.

RABIN, Chaim. Pequena história da língua hebraica. Trad. Rifka Berezin. São Paulo, Summus, 1973.

SÁENZ-BADILLOS, Angel. A History of the Hebrew Language. Cambridge: Cambridge University Press, 1996.

SZPICZKOWSKI, Ana. A essência do hebraico. IN: Revista de Estudos Orientais. Revista do Departamento de Línguas Orientais da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas/USP. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, 1998. N.2. p.23-28.

TREBOLLE BARRERA, Julio. A Bíblia judaica e a Bíblia cristã: introdução à história da Bíblia. Trad. Ramiro Mincato. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.




[1] Extraído de: MALANGA. Eliana Branco. A Bíblia Hebraica como obra aberta: uma proposta interdisciplinar para uma semiologia bíblica. São Paulo: FFLCH/USP; Associação Editorial Humanitas; FAPESP, 2005. p.76-81.

[2] TREBOLLE BARRERA, Julio. A Bíblia judaica e a Bíblia cristã: introdução à história da Bíblia. Trad. Ramiro Mincato. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995. p.75. Comentário: Malanga (2005:78) observa que essas diferenças dialetais são um dos elementos a que recorre o estudioso na tentativa de realizar a datação dos textos e das camadas redacionais. Contudo, o material também pode levar a enganos na tradução e na interpretação dos textos em razão da mudança de sentido que o vocábulo tenha sofrido ao longo do tempo.

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