Ethan Bronner
Em Jerusalém
O povo judeu está marcando na quinta-feira o 60º aniversário de seu renascimento nacional, a fundação de Israel, com os habituais sobrevôos militares, bandeirinhas e programas de televisão recordando os velhos pioneiros.
Mas há outra forma de celebração planejada, e seus patrocinadores acreditam que ela diz algo sobre o caráter nacional: uma conferência de três dias de algumas das melhores mentes de todo o mundo sobre alguns dos maiores desafios que a humanidade -e especialmente os judeus- enfrentará nas próximas décadas.
"O cérebro enriquece o bolso, não o inverso", disse Shimon Peres, o presidente de Israel e patrono da conferência, em uma entrevista. "Nós somos uma terra pequena e um povo pequeno, mas podemos nos tornar um laboratório mundial ousado, e este é nosso desejo e plano."
É esperada a participação de quase 700 convidados nos 35 grupos de discussão na próxima semana. Eles incluem estadistas como Henry A. Kissinger, Vaclav Havel, Tony Blair e Joschka Fischer, mas também Sergey Brin, da Google, Terry Semel, do Yahoo, e Rupert Murdoch, além de sete judeus ganhadores do prêmio Nobel e o presidente Bush.
Dada a lista de convidados, os tópicos são naturalmente grandes e ambiciosos, incluindo o deslocamento do poder global do Ocidente para o Oriente (e sul), proliferação nuclear e mudança climática. Mas grande parte do foco também será dado a assuntos mais próximos de casa, como o extremismo islâmico, a ascensão do Irã e a soberania em Jerusalém.
Na verdade, alguns rotulados como desafios globais -terrorismo, Irã- parecem mais especificamente judeus e israelenses. Os organizadores dizem que isto não é coincidente ou incomum, e apontam como exemplo Hitler, que representava uma enorme ameaça ao mundo, mas se concentrava particularmente nos judeus.
"Os cataclismos sempre parecem afetar os judeus primeiro", comentou Stuart E. Eizenstat, um alto funcionário nos governos Clinton e Carter, que escreveu um ensaio que forma a base da conferência. "Volte até a Peste Negra. Não era uma questão judaica, mas teve um impacto em particular nos judeus porque foram culpados por ela."
Haverá vários autoridades da Europa Central e África, incluindo os presidentes da Geórgia, Polônia e Burkina Fasso.
Ausente da conferência está qualquer representação árabe séria. Líderes árabes e pensadores do Egito, Jordânia e das áreas palestinas foram convidados, mas nenhum confirmou, em parte porque simultaneamente o mundo árabe marcará o 60º aniversário como uma catástrofe conhecida como "Dia da Nakba", que envolverá suas próprias conferências e manifestações. Os organizadores em Jerusalém ainda assim esperam que alguns poucos compareçam.
Peres disse que a idéia para ele era reunir pensadores judeus e não-judeus na esperança, talvez fútil, de "tornar os judeus mais cosmopolitas e o mundo mais judeu".
Ele deu como exemplos a abordagem inovadora de Israel à irrigação e sua forte presença na produção mundial de equipamentos médicos.
"Na China, eles podem não saber quem foi Moisés, mas eles conhecem nossos sistemas de irrigação por gotejamento", ele disse.
Falar sobre Israel e China na mesma sentença, o que ocorrerá muitas vezes na conferência, levanta algumas questões complexas e oferece alguns contrastes espantosos. Segundo o documento de Eizenstat, Israel tem mais engenheiros per capita do que qualquer país no mundo -135 por 100 mil habitantes. (Há 85 por 100 mil nos Estados Unidos.) Mesmo assim, o número total de engenheiros israelenses -quase 100 mil- é minúsculo em comparação ao número que a China produz a cada ano, cerca de 600 mil.
O trabalho de apoio para a conferência foi realizado por um instituto relativamente novo, conhecido como Instituto de Planejamento de Políticas do Povo Judeu, que foi uma criação de um ex-jornalista israelense, chamado Avinoam Bar-Yosef, e cujo presidente é Dennis Ross, o ex-negociador chefe para a paz no Oriente Médio dos Estados Unidos. O instituto busca incorporar planejamento estratégico na vida judaica aqui e no exterior e assegurar que Israel e os judeus do mundo entendam seus interesses comuns.
Um desdobramento significativo nos últimos anos e que será discutido aqui é a mudança no relacionamento entre Israel e a diáspora judaica. Por décadas, Israel era a criança carente que dependia da contribuição e apoio do exterior em sua luta para sobreviver.
Hoje, a população judaica de Israel é de 5,5 milhões e a maior do mundo, à frente da dos Estados Unidos, que está lentamente diminuindo devido à baixa taxa de natalidade e casamentos mistos. Israel se tornou o centro de fato da vida judaica e está cada vez mais sendo requisitado a agir como o irmão mais velho das comunidades judaicas de outras partes.
"Isto impõe certas responsabilidades a Israel como centro da cultura, literatura e pensamento religioso judaicos", disse Eizenstat. "Como Israel tem se concentrado demais em sua segurança, ele não atuou o suficiente no passado para fortalecer a diáspora. Essa ação também vai contra o sionismo, que previa a mudança de todos os judeus para Israel. Mas isso não vai acontecer e Israel está começando a entender que uma diáspora judaica fraca significa um Israel fraco."
Bar-Yosef disse que para ele o sentido do encontro é nutrir a esperança de mudança em Israel, "de ter a disposição de reparar o que precisa ser reparado, assim como também de fazer uma pausa e reconhecer o que foi conseguido em apenas 60 anos".
Tradução: George El Khouri Andolfato
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The New York Times, em 08/05/2008.
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