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Rio de Janeiro, RJ, Brazil
Cláudia Andréa Prata Ferreira é Professora Titular de Literaturas Hebraica e Judaica e Cultura Judaica - do Setor de Língua e Literatura Hebraicas do Departamento de Letras Orientais e Eslavas da Faculdade de Letras da UFRJ.

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quarta-feira, 14 de maio de 2008

Apesar de erros, Estado judeu deve ser celebrado como libertação

Para Mitchell Cohen, independência foi movimento de libertação nacional bem-sucedido. Ele diz que Israel se transformou em bode expiatório para problemas do Oriente Médio.

Daniel Buarque Do G1, em São Paulo.
G1, em 14/05/2008.

“É preciso distinguir políticas de um governo ou outro do projeto em si.” Para o cientista político norte-americano Mitchell Cohen, Israel se transformou em um bode expiatório para os problemas do Oriente Médio, um símbolo do “imperialismo”, que acaba deixando esquecido um movimento de libertação nacional bem-sucedido, cujo 60º aniversário precisa ser celebrado.

Em entrevista ao G1, por e-mail, Cohen disse que comemorar a reconstrução bem-sucedida de um povo perseguido não significa esquecer os palestinos, que também merecem atenção. Questionar a legitimidade do Estado judeu, entretanto, diz, é simplificar de forma tola uma questão muito complicada.

Professor na City University of New York, Cohen tem doutorado na Universidade Columbia e pesquisa a situação no Oriente Médio há décadas. Questionado sobre sua crença pessoal e sua relação com o Estado de Israel, ele disse se tratar de uma pergunta surpreendente e respondeu não ser porta-voz de nenhuma organização política ou religiosa. “Crenças religiosas não são relevantes para as minhas respostas”, disse.

G1 – O senhor escreveu um artigo, “Anti-semitismo e a esquerda que não aprende”, em que aponta os questionamentos à legitimidade do Estado de Israel por conta dos conflitos no Oriente Médio. O senhor acha que o mundo deve celebrar os 60 anos da independência de Israel?
Mitchell Cohen – Israel está submetido a dois parâmetros, especialmente por parte da esquerda. Eu celebro o nascimento do Estado de Israel porque isso representa o sucesso de um movimento de libertação nacional. Há o povo, os judeus, que foram perseguidos por séculos, que foram os “outros” dentro dos Estados ocidentais. Seu sofrimento culminou com o massacre nazista. Das suas origens no final do século XIX, o movimento sionista era pessimista em relação ao futuro dos judeus no Ocidente e na Rússia. Muitos liberais e esquerdistas diziam que eles eram muito “particularistas” e deveriam deixar de lado toda a sua fé em nome de movimentos políticos universais, como comunismo, liberalismo, mas ninguém pode olhar para o último século e dizer que os sionistas estavam errados em ver que o que chamavam de esperanto político estava errado.
É preciso distinguir políticas de um governo ou outro do projeto em si. O Estado judeu representa a reconstrução bem-sucedida de um povo perseguido, brutalizado e assassinado, e é por isso que o mundo deve celebrar seu 60º aniversário. Isso não contradiz a simpatia pelo povo palestino, ou o compromisso com uma solução. Para mim, esta significa a formação de dois Estados: Israel e a Palestina, e levaria Israel para suas fronteiras em 1967 (dependendo de algumas negociações). Eu discordo completamente de “críticos” que querem tirar a legitimidade da existência de Israel e querem que ele desapareça. As reclamações palestinas são legítimas e precisam ser ouvidas, mas, moralmente, é apenas metade da história.

G1 – Este tipo de crítica chega a ameaçar a existência de Israel?
Cohen – Israel é muito forte militarmente. Às vezes sua força é usada de forma sábia, muitas vezes não. As críticas às políticas de Israel não são necessariamente uma ameaça, mas uma campanha real que demoniza o Estado judeu em uma linguagem que chega a soar como anti-semitismo é certamente uma ameaça.
Um país pequeno precisa de simpatia e de aliados. Este tipo de campanha tira de Israel esses dois fatores e isola o Estado judeu em todas as circunstâncias. Incomoda que alguns dos maiores inimigos intelectuais de Israel no Ocidente fazem cobranças ao Estado judeu que não fazem a nenhum outro país. Eles não insistem que milhões de alemães que após a Segunda Guerra Mundial perderam suas casas na Polônia ou na antiga Tchecoslováquia tenham “direito de retornar”, ou não se mexeram quando Saddam Hussein dizimou os curdos.

G1 - Os ataques dos inimigos na região, como o Irã, podem ser considerados uma ameaça real de levar a um conflito mais sério?
Cohen - Claro que o regime no Irã é uma ameaça a Israel. O Irã é a maior e mais ambiciosa força na região, e é controlado por extremistas religiosos. Sei que os críticos de Israel dizem que é preciso “compreender o contexto”, que o Irã rejeita o imperialismo ocidental. O imperialismo ocidental foi muito ruim, mas não podemos aceitar que ele seja culpado de tudo. No século XIX, o social-democrata alemão August Bebel acusou os anti-semitas da esquerda de “anti-semitismo de tolos”, hoje nós temos o “antiimperialismo de tolos”.
Consideremos o contexto atual: um regime de extremistas religiosos que quer a hegemonia regional diz abertamente que quer destruir você. Ele apóia com armas e fundos vários grupos (vamos chamar um deles de Hezbollah) que atacam você e buscam as armas mais destrutivas do mundo. Como você responde? Eu espero que uma situação como esta seja resolvida diplomaticamente, mas sei que você não responde duvidando de um regime que fala e age desta forma, e certamente não se seu país está cheio de pessoas cujos avós foram vítimas de genocídio.

G1 – O senhor acha errado culpar Israel pela violência na região e pela situação dos palestinos? Por quê?

Cohen – É errado e simples: Israel não é culpado de tudo o que acontece na região, e nem mesmo na região que israelense-palestina. De fato, alguns inimigos de Israel parecem pensar que não há nada de errado que um palestino possa fazer que não seja culpa de um israelense (e a direita israelense apenas inverte o pensamento). Se vamos alcançar a paz, este tipo de pensamento tem que ser deixado para trás. Nem todos os conflitos são definidos em preto ou branco, e, no caso de Israel e da Palestina, há certo e errado nos dois lados. É ridículo pensar que Israel é culpado de tudo – mesmo se defensores do ‘antiimperialismo de tolos’ digam isso e nunca consigam ir além de clichês. Muitas vezes me parece que as pessoas que criticam Israel precisam estudar os últimos 500 anos de história do Oriente Médio.
Isso não quer dizer que Israel não tenha nenhuma culpa. O Estado judeu cometeu alguns erros, incluindo alguns muito sérios, como a política de assentamentos. A direita israelense constantemente confunde segurança com questões religiosas e nacionalistas. Acho que a preocupação com segurança é legítima, mas não pode passar das fronteiras de 1967. As lideranças palestinas não são menos culpadas. Arafat teve uma ótima oportunidade em 2000 de chegar à paz no encontro de Camp David – Ehud Barak deixou claro que aceitaria ir além de qualquer outro líder israelense -, mas o palestino parece ter pensado que tinha que conseguir tudo o que queria na negociação. Palestinos falam da “Nakba” (catástrofe) de 1948, mas seus líderes não são uma catástrofe menor para eles, e o maior dos desastres é o Hamas.

G1 – Críticos de Israel dizem que o Estado usa o Holocausto como desculpa para agir com violência contra seus inimigos. O que o senhor acha disso?
Cohen – Esta é outra arma usada pelos que questionam o direito de Israel de existir. O debate político abusa do Holocausto? Sim, mas não mais de que o debate político diz que Israel é um “agressor imperialista”. Ainda assim, me parece mais parte da demonização dos “sionistas” – que muitas vezes chão chamados de “nazistas” – de que abuso do Holocausto por parte de Israel.
Quando Israel age com força contra seus inimigos, isso precisa ser julgado de acordo com os parâmetros normais, do que é justo e injusto em conflitos armados. Quando um grupo palestino ataca o Exército israelense, isso não é um ato terrorista, mas um ato de guerra, e os israelenses têm direito de responder a um ato de guerra dentro dos limites do que é aceitável numa guerra. Quando grupos palestinos explodem crianças numa praça, é um ato de terrorismo, e Israel tem o direito de responder dentro dos limites do que é aceitável dentro de uma guerra. Se o Hamas ataca Israel, eles se tornam alvos legítimos. Civis palestinos não são alvos legítimos.

G1 – Estudos demográficos apontam que o número de árabes vivendo na região controlada por Israel pode ser maior de que o de judeus em 2020. Como o Estado pode continuar sendo um Estado judeu, sem ir contra a democracia?

Cohen – É importante distinguir entre árabes que são cidadãos de Israel e árabes que vivem na Cisjordânia e não são cidadãos de Israel. Israelenses foram alertados desde 1967 que a anexação dos territórios ocupados significariam o fim de Israel como um Estado judeu democrático. Acho que isso está certo. Quando Israel ocupou os territórios em 1967, o fez em autodefesa. Acho que este era o caso à época, mas os territórios não deveriam ter se tornado um assentamento e não deveria ter se tornado moeda de troca. Num acordo de paz justo, Israel não teria mais controle sobre os palestinos na Cisjordânia, e os árabes vivendo em Israel deveriam ter os mesmos direitos democráticos que as minorias em qualquer outro país do mundo (como os próprios judeus).

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