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'Estou incomodado com tanta burrice'
Escritor israelense se diz sem paciência para guerras inúteis e defende diálogo
ENTREVISTA A.B. Yehoshua
JERUSALÉM. Autor de 11 livros, o escritor A.B. Yehoshua foi um dos renomados intelectuais israelenses que protestaram publicamente contra a ofensiva militar na Faixa de Gaza. Seguindo o exemplo de Amos Oz, Shulamit Alonie David Grossman , Yehoshua, de 72 anos, quebrou o silêncio e pediu o fim da operação num artigo publicado no jornal italiano “La Stampa”. Dizendose cansado e sem paciência para o que chama de guerras inúteis, ele não escondeu a irritação e disse ao GLOBO que já é hora de normalizar as relações com os vizinhos do outro lado da fronteira.
Renata Malkes Especial para O GLOBO
O GLOBO: Embora o senhor tenha dito que a intervenção militar em Gaza foi uma necessidade, agora já defende seu fim.
Por quê? A.B. YEHOSHUA: Era uma necessidade porque Israel precisava reagir. Não se pode ser bombardeado com 70 mísseis por dia e ficar calado. Não se pode permitir que milhares de civis passem os dias enclausurados em abrigos antiaéreos no sul do país. Mas chega de violência! Somos todos vizinhos, quanto menos sangue, melhor será para nosso futuro.
É preciso negociar um cessar-fogo o mais rápido possível.
Israel precisa de reações mais proporcionais e o Hamas deveria ter parado com o lançamentos desses mísseis há muito tempo. O que eles ganham com isso? Por que seguem neste jogo tolo? E qual é a sua resposta para essas questões? YEHOSHUA: Não sei. Desde 2005, Israel deixou Gaza fisicamente, não há colonos ou presença militar. Se Gaza continua isolada e com os postos de controle fechados é porque o lançamento de mísseis não pára. Nunca parou por muito tempo. Gostaria que um cessarfogo verdadeiro, com garantias e mediadores internacionais, fosse alcançado, que as fronteiras fossem reabertas e que os trabalhadores de Gaza voltassem a buscar seu sustento em Israel, como no passado.
Não gosto do jogo diplomático vazio. Poderíamos negociar com o Hamas direta ou indiretamente a qualquer momento, isto é o que menos me incomoda como israelense.
O senhor mora em Haifa.
Durante a segunda guerra do Líbano, em 2006, ficou sob estado de alerta, ameaçado pelos mísseis do Hezbollah, e conheceu de perto o medo das explosões. Mesmo de longe, a violência em Gaza tem afetado seu dia-a-dia?
YEHOSHUA: Estou simplesmente incomodado com tanta burrice. Acompanho o noticiário o tempo todo, como todo o resto dos israelenses, mas estou velho e cansado.
Já presenciei várias guerras em Israel e me prometi que não fico mais preocupado, irritado ou ansioso. Tento não me aborrecer como no passado, mas admito que os últimos acontecimentos em Gaza têm me perturbado.
Que mensagem pessoal o senhor poderia enviar aos moradores de Gaza?
YEHOSHUA: Que parem de apoiar o Hamas. Gostaria que eles se perguntassem o que o grupo radical islâmico lhes proporcionou nos últimos dois anos. Segurança? Desenvolvimento econômico? Tranqüilidade? A resposta é nada: eles tomaram um rumo errado, fizeram escolhas erradas. A vida na Cisjordânia é muito melhor, e eles sabem disso. Cidades como Ramallah tiveram sua qualidade de vida melhorada.
Nem mesmo os palestinos da Cisjordânia são capazes de expressar uma solidariedade verdadeira aos moradores de Gaza. Espero que sejam capazes de voltar atrás e optar por um caminho novo e alternativo.
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Até a sogra surda ouviu explosão
São 12h25m e a cidade está tremendo, literalmente e figurativamente.
A manhã começou bem e quieta o suficiente já que não houve alertas durante a noite, o que nos deu uma falsa esperança de que o pior tinha passado. Isso até o primeiro alarme do dia, às 9h15m da manhã.
Nós descemos as escadas com os cachorros até o hall da minha sogra. Ela já nos esperava com a empregada, que murmurava alguma coisa em russo como “ói, ói, ói”. Foi então que uma forte explosão sacudiu os ares. Foi tão alta que minha sogra ouviu, e sem os aparelhos auditivos ela não escuta nada.
Esse ataque não foi muito longe de nossa casa, aconteceu a uns dez minutos a pé.
Depois houve mais 12 foguetes, sendo o último ainda mais perto de casa.
O Comando da Frente Interna nos disse para ficar em casa; então não vou ao trabalho hoje, mesmo já estando vestida e pronta para sair.
Shani também não vai ao trabalho hoje. As ruas estão desertas.
Uma amiga devia se casar amanhã nas cercanias de Ashdod, mas o Comando cancelou qualquer aglomeração com mais de 40 pessoas e ela desmarcou o casamento até o tumulto passar.
As lojas estão fechadas, a Universidade de Ashkelon cancelou as aulas e, apesar de o sol brilhar, este não é um dia de sol.
Minha amiga Leone tem razão: se estivéssemos tentando matar civis, com nossos ataques aéreos, 300 seria um número vergonhoso! Já teríamos matado milhares e milhares. Mas isso passa despercebido.
Estamos apenas esperando pelo próximo (ataque).
Recebemos convites de amigos e parentes distantes e até de alguns alunos meus da universidade para ficar na casa deles fora do raio de alcance dos foguetes. Mas por enquanto preferimos ficar, é muita dor de cabeça.
MORADORA DE Ashkelon, em depoimento anônimo reproduzido pelo jornal “The Jerusalem Post”
O Globo, Mundo, páginas 26, 27, 28 e 29, em 31/12/2008.
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