Lá pela metade da tarde de quarta-feira, Ani Anighotri estava na sua rotina multitarefas, navegando pela internet enquanto batia papo com um amigo sobre uma viagem de negócios recente que fez da Geórgia, onde mora, para sua terra natal, a Índia. Então uma mensagem de e-mail apareceu em sua tela e acabou com a graça da conversa. O campo do assunto dizia: "Ataque em Mumbai".
A mensagem que se seguia contava a Anighotri as notícias dos ataques aleatórios em Mumbai. Ele foi para um site e descobriu o relato de um segundo ataque, similar ao primeiro. Então, ligando uma televisão a cabo indiana, Anighotri viu que o fogo ateado pelos terroristas queimava o Palácio Taj Mahal e o Tower Hotel, o mesmo em que ele havia ficado há apenas três semanas.
Na quinta-feira de manhã, Anighotri havia descoberto outro ponto de conexão mais sutil. Agora estava claro que além dos hotéis, um café, uma estação de trem e dois hospitais, os terroristas haviam invadido um centro de assistência social judaico, administrado pelo movimento Chabad Lubvitch. Anighotri absorveu essas notícias na posição de co-presidente de um grupo de 80 membros na área de Atlanta chamado Coalizão Indo-Judaica.
De uma forma modesta, a coalizão se propõe a aprofundar as ligações entre judeus e indianos, seja em Israel, na Índia ou nos Estados Unidos; e os eventos desta semana demonstram talvez o elemento mais visceral e terrível desta conexão, apesar de estar longe de ser o único.
"Vejo que existe uma afinidade natural em desenvolvimento entre a Índia e Israel e o povo judeu", diz Anighotri, 48, que é dono de companhias de tecnologia e consultoria. "Porque ambos os países e povos foram afetados por esse tipo de terror - a morte de civis, algo desprezível que vem acontecendo ano após ano".
Cedric Suzman, que até recentemente era co-presidente do grupo de Atlanta, ecoou o sentimento. "Em tempos como esse, você de repente percebe que construiu pontes", disse Suzman, em entrevista por telefone. "Então em vez de recriminação e acusação, você tem um grande sentimento de simpatia e compreensão".
A afinidade de que ambos os homens falam vai muito além da experiência comum de ser alvo do terrorismo islâmico, ou dos conseqüentes laços militares e de segurança existentes entre Índia e Israel. O tecido mais fino da experiência humana - cultura, religião, valores - também liga indianos e judeus.
"A melhor forma de explicar isso é o que eu disse à minha filha: 'Se você tiver que se casar fora da Índia, case-se com um judeu", diz Shoba Narayan, escritora de Bangalore que visitou Israel com seu marido, um banqueiro de investimentos. "As culturas são tão semelhantes - o comprometimento com a educação, a capacidade de adiar as gratificações, o trabalho duro, a culpa, o fatalismo. E acho que isso é porque ambas são culturas antigas".
De fato, uma comunidade judaica conhecida como Bene Israel viveu na Índia por mais de 2.400 anos, totalmente tolerada pelas populações hindu e sikh ao redor. Mesmo assim, em suas primeiras décadas depois da independência, a Índia criticou com freqüência o sionismo e foi em parte aliada da União Soviética.
Com o fim da Guerra Fria, e do confiável fluxo de armas e equipamentos russos, a Índia voltou-se para Israel na busca de um fornecedor de armas e conhecimento militar, diz Efraim Inbar, diretor do Centro Begin-Sadat de Estudos Estratégicos na Universidade de Bar-Ilan em Israel. Israel agora vende mais de US$ 1 bilhão em armas anualmente para a Índia, incluindo o sistema de alerta Falcon e mísseis de mar-para-ar.
De uma maneira bem menos óbvia, os soldados também criaram laços. Cerca de 30 mil israelenses visitam a Índia todos os anos, muitos deles em férias prolongadas depois de cumprir o serviço militar. Por sua vez, eles levam de volta para Israel a comida, tecidos, música e misticismo da Índia, principalmente dos hindus.
A banda israelense popular Sheva incorporou instrumentos indianos e estruturas de cordas em sua música. Aulas de ioga proliferam em Israel. A comida hindu, com sua ênfase em pratos vegetarianos, foi facilmente adaptada à culinária kosher. Um festival anual chamado Boombamela celebra tudo que é indiano, ainda que com um viés um tanto inocente, meio Nova Era.
Para os judeus americanos da geração baby boom, a fascinação com a Índia começou com as buscas espirituais dos anos 60. Ao longo do tempo, a meditação budista tornou-se uma base do movimento de renovação judaica e o livro "The Jew in the Lotus" ["O Judeu no Lótus"], de Rodger Kramenetz, tornou-se um texto venerado. Na última década, havia tantos judeus praticando algum tipo de budismo, que geraram um novo nome próprio: Jew-Bu [algo como Ju-Bu].
Mais recentemente, surgiu o termo "Hinjew" ["Hinju"]. Ele não reflete uma amálgama religiosa, o que seria praticamente impossível devido ao politeísmo hindu, tanto quanto o faz o terreno cultural comum entre os judeus americanos e indianos-americanos que cresceram e foram para a escola juntos.
Em subúrbios como Great Neck em Long Island ou West Windsor, Nova Jersey, as mesmas escolas públicas de qualidade que atraíram os judeus que saíram das cidades nos anos 50 têm atraído os imigrantes indianos mais recentemente.
"Alguns de nós na comunidade indiana-americana sentimos que nossos amigos judeus-americanos demonstram um ótimo exemplo de serem bons cidadãos", diz Anighotri. "Seu ativismo, valores sociais, valores familiares, valores educacionais. Muitos deles são profissionais e empreendedores, e isso também é o que vemos na comunidade indiana".
O grau de conforto entre judeus e indianos permitiu também o surgimento de um humor específico de auto-zombaria, que pode ser um bálsamo psíquico nesses momentos de atrocidade. De acordo com uma história imitando notícia no site SatireWire:
"Líderes Hinju reconheceram hoje que a fusão do hinduísmo e do judaísmo não funcionou como planejado, em vez de formar uma super-religião para lutar contra o inimigo islâmico comum, eles acabaram criando uma raça de 900 milhões de pessoas que, não importa quantas vezes reencarnem, nunca são capazes de agradar suas mães".
Tradução: Eloise De Vylder
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