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Rio de Janeiro, RJ, Brazil
Cláudia Andréa Prata Ferreira é Professora Titular de Literaturas Hebraica e Judaica e Cultura Judaica - do Setor de Língua e Literatura Hebraicas do Departamento de Letras Orientais e Eslavas da Faculdade de Letras da UFRJ.

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segunda-feira, 16 de junho de 2008

Em Gaza, assim como em Teerã (Renata Malkes)


Fé, repressão e privações marcam a vida um ano após a chegada do Hamas ao poder

Renata Malkes
Especial para O GLOBO
O Globo, Mundo, página 41, em 15/06/2008.

TEL AVIV. Uma caminhada atenta pelos arredores da praça Al Jundi al-Majhoul, no centro da Cidade de Gaza, torna inevitável uma comparação com os bairros conservadores da capital iraniana, Teerã. Um ano após o golpe militar que levou o grupo radical islâmico Hamas ao poder na Faixa de Gaza e um embargo israelense que mergulhou a região na maior crise humanitária dos últimos 60 anos, os moradores de Gaza dão sinais de que se agarrar à fé é a única solução para superar as dificuldades do dia-a-dia. É cada vez maior o número de mulheres cobertas pelo hijab, o tradicional véu islâmico, e muitas que já adotavam o adereço passaram no último ano a usar o chador, a vestimenta negra usada pelas muçulmanas xiitas iranianas. Cada vez mais conservadora, a sociedade de Gaza tem ainda um número recorde de homens que cultivam as barbas, deixando claro um processo de islamização que caminha a passos tão largos quanto a rápida deterioração da qualidade de vida num dos territórios mais populosos do mundo.

Altíssimo índice de desemprego
Para o cientista político Mkhaimar Abu Saada, da Universidade al-Azhar, o marco do primeiro ano da chamada revolução verde, que levou o Hamas ao poder, é uma oportunidade para que os palestinos reflitam. Segundo ele, trata-se do pior ano da história palestina, já que o rompimento das ligações entre o Hamas e o Fatah deixou a população dividida e a comunidade internacional descrente quanto à solução do conflito árabe-israelense. Com índices de desemprego beirando os 65% da população econômicamente ativa e a queda da renda per capita de U$1.500 para apenas US$ 600 anuais, os 1,5 milhão de moradores da Faixa de Gaza parecem ter perdido a esperança por dias melhores.

— Além da pobreza, do abandono e da dificuldade de sobreviver após o embargo israelense que sucedeu a tomada de poder pelo Hamas, hoje vê-se as pessoas nas ruas mais religiosas, mais reclusas e sem esperança.

Nunca se viu tantos homens usando barbas, é um momento de religiosidade extrema. Somos sunitas, mas muitos se voltaram às normas religiosas do Islã xiita por desespero, outros, para sobreviver — afirmou Abu Saada.

— Hoje o Hamas é a única fonte de empregos em Gaza. Por ser um movimento religioso, muitos adotaram um modo de vida conservador em busca de uma colocação, seja nas forças de segurança, seja nos serviços civis do governo Hamas. Essa religiosidade, no entanto, não significa uma volta ao extremismo. Os palestinos de Gaza voltaram a sonhar com uma união nacional e a volta de um governo em que Hamas e Fatah possam estar juntos para combater a ocupação de Israel — arrisca Abu Saada.

A crise sem precedentes tem como símbolo os combustíveis.

O fechamento das fronteiras e o corte parcial das transferências de diesel para a Faixa de Gaza após um ataque contra o terminal de Nahal Oz, na fronteira com Israel, em abril, paralisaram 85% dos transportes. Pelo menos 145 postos de gasolina foram obrigados a lacrar as bombas e, em algumas cidades, são raros os carros circulando nas ruas. Houve até quem tentasse usar óleo de cozinha para abastecer seus veículos. O diretor do Centro Palestino de Direitos Humanos, Jaber Wishah, garante que 50% dos alunos da rede de ensino correm risco de perder o ano letivo por não conseguir chegar às escolas e universidades.

Longas distâncias são percorridas à pé ou de carroça.

— A situação é insustentável.

Não sabemos se culpamos a administração do Hamas ou o bloqueio israelense. Ou os dois. O fato é que Israel precisa liberar as fronteiras. Por diversas vezes estivemos à beira do caos, mas nunca como agora — afirma Wishah.

As possibilidades de retomar o governo de união nacional entre todas as facções palestinas dividem os analistas locais e racham ainda mais a opinião pública.

Falta consenso entre o Hamas e o Fatah em áreas fundamentais como política interna, externa e a reconstrução da Organização para a Libertação da Palestina (OLP).

O desafio das fronteiras
Apesar de uma aparente queda da popularidade do grupo, segundo as últimas pesquisas de opinião, o futuro político do Hamas estaria condicionado à reabertura imediata das fronteiras, que facilitaria a vida dos moradores e ajudaria a melhorar a imagem de um governo desgastado e tido como ilícito pela comunidade internacional. Cético, o cientista político Assad Abu Sharek, da Universidade de Gaza, acredita que as propostas de diálogo feitas na última semana pelo presidente palestino, Mahmoud Abbas, do Fatah, são apenas uma forma de pressionar Israel a levar adiante as negociações de paz mantidas entre Ramallah e Jerusalém com a supervisão da Casa Branca. A crise na Faixa de Gaza, para ele, só seria solucionada com a intervenção da Liga Árabe.

— Os esforços do Egito não são suficientes. Ninguém quer intervir num processo já condenado ao fracasso. Estamos encurralados e não se sabe como superar as divergências entre as facções, embora todos compreendam a necessidade de união nacional. Talvez como resistência o Hamas esteja mais organizado e tenha se fortalecido, ganhado novos armamentos e técnicas de combate, mas o governo Hamas está condenado ao fracasso. Eles levam apenas uma vitória, que é a devolução da segurança às ruas de Gaza. Há um ano, gangues se enfrentavam nas ruas, matavam e roubavam à luz do dia. Parece contraditório, mas hoje a Faixa de Gaza é um lugar mais seguro. Há lei e ordem, além da qualidade no atendimento dos serviços públicos, reorganizados, e do fim da corrupção. Este mérito não se pode tirar do movimento islâmico — afirma Abu Sharek.

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