De Gerhard Spörl, Der Spiegel, em 19/06/2008.
Em entrevista para a "Spiegel Online", o primeiro-ministro de Israel, Ehud Olmert, discute as negociações de paz de Jerusalém com a Síria, o cessar-fogo com o Hamas, suas perspectivas de sobrevivência política e explica por que Israel não pode viver sob a ameaça de um Irã nuclear.
Spiegel Online - Primeiro-ministro Olmert, quão sérias são as negociações que Israel está realizando com a Síria por meio de mediadores turcos? E qual é a probabilidade de que o senhor consiga chegar a um acordo e obter a paz com a Síria?
Olmert - Eu nunca achei que a Síria e Israel deveriam se envolver em um confronto violento, porque não acho que haja qualquer interesse em particular para qualquer um de nós fazer isso. A verdade é que nos últimos 30 anos a fronteira entre Israel e a Síria está muito tranqüila. Ambos os lados mantiveram seu compromisso segundo o cessar-fogo assinado após a guerra de 1973, e não tivemos nenhuma queixa. Mas o fato da Síria ter se posicionado como parte do "Eixo do Mal", ter sabotado o sistema político no Líbano, apoiado o Hamas e facilitado o terror contra a América no Iraque é algo que pode ser mudado ou por meio de um confronto violento ou por um processo político. E acho que se há uma chance para o processo político, ele deve ser tentado.
Spiegel Online - Qual será a próxima etapa das negociações?
Olmert - Em breve ela terá que ser direta. Se for para ser séria e significativa, será preciso ser direta. Nós conversamos com a Síria no passado, quando o falecido Yitzhak Rabin era o primeiro-ministro, quando Ehud Barak era o primeiro-ministro, quando Benjamin Netanyahu era o primeiro-ministro. De forma que acho que podemos conversar diretamente e acho que pode ser sério. É claro que no momento os sírios dizem que não darão as costas para o Irã. Mas o simples fato de acertarem a paz com Israel mudaria as realidades da região de forma significativa. Eu falo sério, quero fazê-lo e continuarei fazendo os esforços necessários.
Spiegel Online - Quando chegará o ponto de negociações diretas?
Olmert - Eu acho que quando concordarmos na agenda para ambos os lados, então acho que será hora das negociações. Eu não acho que estamos longe disso. Nós mais ou menos sabemos quais são as questões. Nós discutimos estas questões no passado com os sírios. Nós mais ou menos sabemos o que eles desejam e eles sabem o que nós queremos, então não estamos muito distantes. Eu acho que se formos sérios e eles forem sérios, então teremos que nos sentar juntos na mesma sala e resolvermos os assuntos.
Spiegel Online - O presidente da França, Nicolas Sarkozy, convidou o presidente da Síria, Bashar Assad, e o senhor para participarem de sua conferência para lançamento de seu projeto da "União Mediterrânea". O senhor se encontrará diretamente com o presidente sírio?
Olmert - Eu prometi ao presidente Sarkozy que iria ao seu evento. Não posso dizer mais do que isso porque não sou o organizador. Eu definitivamente ficarei feliz em ser o convidado do presidente
Spiegel Online - Como o senhor pretende ganhar o apoio do povo israelense para a devolução das Colinas de Golan à Síria?
Olmert - Chegará o momento em que o povo de Israel decidirá, independente de quem seja o mensageiro. A questão sobre se o mensageiro é popular, ou não, é marginal. Se for para haver um entendimento, ele terá a aprovação de Israel. Isto não pode ser executado pelas costas do povo israelense. Ele terá que determinar o que deseja -por meio dos representantes no Knesset, por meio de eleições diretas, de alguma forma. E eu confio que se o acordo for bom o bastante para o governo de Israel aceitá-lo, então muito provavelmente a maioria dos israelenses o aprovará.
Spiegel Online - Nos fale mais sobre o que há nele para os israelenses...
Olmert - Paz! É o que nós queremos. Nós queremos uma paz genuína. É claro que paz traz segurança, porque não temos que esperar todo ano para sabermos se eles cometerão um erro de cálculo ou nós cometeremos um erro. Se eles não apoiarem o terror, eles não serão o centro de terror que são hoje. As sedes do Hamas, da Jihad Islâmica, de todas as outras estão
Spiegel Online - O Líbano faz parte das negociações com os sírios?
Olmert - Não. Mas estou pronto a iniciar negociações com Fouad Siniora, o primeiro-ministro do Líbano, amanhã. Não há nenhum motivo para que isso não ocorra.
Spiegel Online - O senhor gostaria que a Síria voltasse a ter um papel mais ativo no Líbano visando conter o Hizbollah?
Olmert - Vamos tratar disso passo a passo. Primeiro, vamos estabelecer uma confiança entre nós e os sírios. Eles não exerceram esse papel estabilizador no Líbano ao longo dos anos.
Spiegel Online - Em relação à troca de presos com o Hizbollah, o senhor acha que o mediador alemão que está ajudando nestas negociações está fazendo um bom trabalho?
Olmert - Nós somos mais do que gratos pela assistência dele, pela contribuição do governo alemão em muitas das questões que fizeram parte de nossa agenda nos últimos anos, incluindo esta. Nós ainda estamos no meio do processo; ainda não está resolvido.
Spiegel Online - Os europeus ficaram bastante surpresos com o anúncio do início de negociações de paz entre Israel e a Síria, especialmente dados os ataques aéreos de setembro de 2007 contra um suposto sítio nuclear, que todos presumem ter sido conduzido por Israel.Olmert - Primeiro, eu não me lembro de Israel ter feito qualquer anúncio sobre o evento ao qual você se refere. Mas estou certo de que mesmo se alguns países europeus tiverem se surpreendido, nenhum deles ficou desapontado. E acho que é um desenvolvimento positivo; isto pode promover mais estabilidade e mais continuidade em uma área tão problemática.
Spiegel Online - Quão séria é a capacidade nuclear do Irã? O senhor consideraria lançar um ataque preventivo lá?
Olmert - É séria. Israel há muito é da opinião de que os iranianos têm um programa militar que lutam para dar continuidade. Por que você precisa enriquecer urânio se não conta com as instalações que podem fazer uso deste urânio para fins civis? A informação que recebo é séria o suficiente para justificar minha preocupação com o programa iraniano.
Spiegel Online - O que pode ser feito?
Olmert - Há muitas coisas que estão sendo feitas. E acho que há mais coisas que devem ser feitas. Israel não é o líder neste esforço -a liderança cabe à América, à Rússia, à China, ao Reino Unido, à Alemanha, à França, às grandes potências do mundo que dispõem da capacidade, em um esforço concentrado, de impedir o progresso dos iranianos.
Spiegel Online - Se o senhor sentir que as sanções não estão obtendo nenhum resultado, há algum ponto que Israel agirá por conta própria?
Olmert - Primeiro, as sanções são de ajuda. Elas são suficientes? Provavelmente não. Há outras medidas que são de ajuda? Sim. Estas medidas podem ser eficazes e úteis? Eu pessoalmente acho que há medidas muito úteis e eficazes que ainda podem ser aplicadas.
Spiegel Online - Por exemplo?
Olmert - Há muitas coisas que podem ser feitas econômica, política, diplomática e militarmente.
Spiegel Online - Israel pode conviver com um Irã nuclear?
Olmert - Não. Eu não acho -considerando a natureza do regime iraniano- que possa ser esperado que Israel viva sob a ameaça de que possam usá-la.
Spiegel Online - Israel dispõe de capacidade militar para remover qualquer ameaça nuclear por conta própria?
Olmert - Eu acho que as capacidades de Israel são bem conhecidas pelo mundo e não preciso entrar em detalhes e analisá-las ou descrevê-las além do que todos sabem.
Spiegel Online - A Doutrina Begin, que estipula que Israel pode agir por conta própria caso se sinta ameaçado, ainda se aplica hoje?
Olmert - Israel sempre precisa estar em posição de se defender contra qualquer adversário e contra qualquer tipo de ameaça.
Spiegel Online - Em Gaza, quão confiante o senhor está de que a trégua com o Hamas será mantida?
Olmert - Eu não acho que o Hamas está particularmente ansioso para que Israel use toda sua superioridade militar para atacá-lo. Eu não estou dizendo que não pode acontecer, porque nós chegamos bem perto do fim de nossa tolerância em relação ao terror de Gaza. Nós estamos muito próximos do ponto onde não conseguiremos mais tolerar mais nada. Os egípcios estavam interessados em impedir isso porque temem que se houver uma reação israelense, então a reação poderá levar grande parte da população de Gaza a se mudar para o Egito, como já aconteceu. Os egípcios não estão particularmente interessados [em ver isso acontecer de novo]. Nós os informamos sobre quais eram os parâmetros israelenses para não agir
'Nós demos um passo significativo à frente'
Spiegel Online - O primeiro-ministro do Hamas, Ismail Haniyeh, foi citado na quarta-feira como tendo dito que uma trégua estava próxima, mas que a questão estava separada da questão sobre o futuro do soldado israelense seqüestrado, Gilad Schalit.
Olmert - Israel nunca disse que precisa ser simultânea mas, como eu disse, para nós nada estará completo até que Schalit esteja de volta.
Spiegel Online - A população em Gaza não parece ver qualquer incentivo para convencê-la a parar de disparar os foguetes Qassam contra Israel.
Olmert - Eu sou mais otimista que você. Eu acho que há um bocado de gente em Gaza que está cheia e cansada destas atrocidades e violência. Eu vi Tim Sebastian na "BBC" há alguns dias e eram estas jovens de Gaza que estavam criticando o líder do Hamas, Mahmud Al Zahar, dizendo: "Você está destruindo nossas vidas em vez de ajudar o povo de Gaza".
Spiegel Online - Mas Israel controla as fronteiras. Se pararem de disparar foguetes, Israel facilitará a passagem nos pontos de travessia?
Olmert - Nós dissemos isso! A passagem nos pontos de travessia era muito mais ativa quando não disparavam tanto. Eu intervim pessoalmente naquele momento visando a reabertura diária das travessias de Erez e Karni das 6h às 23h, para que 480 caminhões pudessem atravessar com 20 ou 30 toneladas cada de mercadorias e alimentos.
Spiegel Online - A secretária de Estado americana, Condoleeza Rice, criticou a construção de um novo assentamento durante sua visita a Israel no início desta semana.
Olmert - Eu entendo a sensibilidade dos palestinos, mas discordo. Antes da conferência de Annapolis em dezembro passado, havia apenas o roteiro internacional para a paz. Ele dizia que se não houvesse recuo do terror, não haveria negociações. Cada lado ficou sentado acusando o outro. Eu cheguei a Abu Mazen (o presidente palestino Mahmoud Abbas) e disse: "Ok, há terror. Você combaterá o terror e enquanto isso vamos conversar. Não vamos perder tempo!" A sabedoria de Annapolis é que, independente dos obstáculos da periferia, nós prosseguimos na corrente principal e tentamos chegar a um entendimento. Se chegarmos a um entendimento, então as fronteiras serão acertadas. O que ficar no lado israelense continuará israelense e o que cair no lado palestino se tornará palestino -mesmo se tiver sido construído pelos israelenses. E ao mesmo tempo, o terror terá que ser detido totalmente porque não haverá implantação antes que o terror seja completamente detido.
Spiegel Online - Existe possibilidade de um acordo até o final deste ano, como esboçado em Annapolis?
Olmert - O propósito destas negociações é definir com precisão o conceito de uma solução de dois Estados, o que significa uma solução proposta para a questão dos refugiados, dos arranjos de segurança, da questão de Jerusalém e assim por diante. Nós demos um passo significativo, importante, à frente. Nós dissemos que esperamos chegar a um entendimento nestas questões até o final de 2008. Nós dissemos que tentaríamos. E acho que é possível.
Spiegel Online - O senhor está atualmente sob investigação policial. Quão confiante o senhor está de que conseguirá sobreviver politicamente até o final de seu mandato?
Olmert - Olhe, milagres no Oriente Médio são uma realidade. Ben Gurion já disse: "Apenas aqueles que acreditam em milagres são realistas no Oriente Médio". Então tudo pode acontecer. Todos os meus antecessores foram investigados, todos foram acusados, todos foram processados -em um clima que às vezes era intolerável. E todos ainda estão sãos e salvos -com exceção de Ariel Sharon, a quem desejo o melhor para uma recuperação completa. Quando assumi há dois anos e meio, havia poucos israelenses que acreditavam que no final de junho de 2008 eu ainda seria o primeiro-ministro -especialmente considerando os desafios que enfrentei. Mas aqui estou eu. Estou sentado aqui e não tenho intenção de sair.
Tradução: George El Khouri Andolfato
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