Público, Destaque, páginas 2 e 3, em 12/02/2009.
Público, Destaque, página 2, em 12/02/2009.
Bibi Netanyahu lidera cenários pós-eleitorais para governar
12.02.2009, Alexandra Lucas Coelho, em Jerusalém
Como desatar o nó das eleições? Bibi com Livni, Bibi sem Livni são os cenários falados. Entre os palestinianos, nenhuma expectativa para a paz
Depois da caça ao voto, é a caça a Avigdor Lieberman. Nos sites israelitas, ontem as notícias avançavam por esta ordem: "Livni vai reunir-se com Lieberman", "Livni está reunida com Lieberman", "Bibi vai reunir-se com Lieberman", "Bibi está reunido com Lieberman".
Confirmando a tendência dos últimos dias, em que a vantagem do Likud de Bibi Netanyahu foi diminuindo, o Kadima de Tzipi Livni ganhou por um deputado. Em 120, o Kadima teve 28 e o Likud 27, o que significa que nenhum tem maioria para formar governo, ambos precisam de vários outros partidos, e por isso negociar com Lieberman é uma prioridade.
Com 15 deputados [Yisrael Betenu], o líder da extrema-direita é agora a terceira maior força nacional, e ainda não disse se preferia Livni ou Bibi.
Mas é consensual entre os analistas que Netanyahu parece ter mais apoios que Livni para uma coligação, porque o bloco de direita soma 65 deputados, e o bloco de esquerda apenas 55.
A direita subiu e a esquerda baixou, e se Livni conseguiu um bom resultado foi à custa dos que estão à sua esquerda. Terá beneficiado do voto útil de muita gente que principalmente não queria Netanyahu no governo, sobretudo eleitores trabalhistas e do Meretz.
E isso ajuda explicar o desaire destes dois partidos. O Labour, o grande partido histórico de Israel, está reduzido a uns catastróficos 13 deputados. E o Meretz ficou com três, e em estado de choque - é possível que tenha perdido também para o Hadash, liderado pelo árabe Mohammed Barakeh em aliança com o comunista judeu Dov Hanin, agora com quatro deputados. A dita esquerda radical e os partidos árabes não desceram, pelo contrário.
Com 99 por cento de resultados apurados, faltam os votos dos soldados e dos diplomatas. Serão conhecidos esta noite, e poderão significar um deputado. Como os soldados tendem a votar à direita, isso pode beneficiar ainda mais Bibi.
Os próximos dias serão de frenéticas negociação de bastidores. O Presidente Shimon Peres recebe os partidos para a semana. Cada partido recomenda um nome. Esse nome vai somando deputados consoante o peso de cada partido. Peres depois nomeia o líder que tiver mais apoios entre os deputados. Ontem um porta-voz presidencial disse que essa nomeação poderá acontecer por volta de dia 20.
Como desatar o nó
"O resultado é um nó, era previsível", resume ao PÚBLICO Nahum Barnea, do jornal Yedioth Ahronoth. E este comentador político, talvez o mais famoso da imprensa israelita, vê duas formas de desatar o nó.
"A primeira é que haja uma divisão de poder entre Likud e Kadima, com a possibilidade de rotação de primeiro-ministro entre Livni e Bibi ou com igual número de ministros e um deles como primeiro-ministro."
Logo após o anúncio das previsões, o Kadima pareceu inclinado para uma solução dessas. E ontem Livni voltou a propor um governo com o Likud chefiado por ela. Mas a ideia da rotação parece pouco popular. Do lado do Likud apareceu um deputado a dizer que a rotação é para quando há empates de 60-60 nos blocos. E, do lado do Kadima, apareceu um ministro a dizer que a rotação "é uma experiência" que "em geral não resulta".
E tanto Livni como Bibi parecem muito empenhados em ser primeiros-ministros. Bibi nem esperou pela manhã seguinte para apelar a uma coligação chefiada por ele, e Livni ontem disse: "As pessoas escolheram-me. Sinto uma grande responsabilidade de traduzir o poder que me foi dado em acção."
O Kadima é o partido fundado por Sharon na sequência da retirada de Gaza, que foi fracturante no Likud.
Cresceu com gente do Likud, dos Trabalhistas, mas não tem raízes em Israel, e foi desgastado pela actuação do actual primeiro-ministro, Ehud Olmert, na guerra do Líbano e por escândalos de corrupção. Quando Bibi era dado como vencedor certo, há semanas, pensou-se que o Kadima pudesse implodir depois das eleições. Parte da vitória de Livni foi ter conseguido segurá-lo, e bater-se mesmo pelo primeiro lugar.
Mas não é suficiente para um bloco de centro-esquerda, e o segundo cenário previsto por Nahum Barnea não inclui Livni. "Netanyahu pode liderar uma coligação de direita, porque tecnicamente está em melhor posição para formar governo."
E Lieberman será um kingmaker, aquele que decide. "Para formar governo não basta Lieberman, são precisos vários partidos", diz Barnea. "A diferença entre Lieberman e o [partido ultra-ortodoxo] Shas é que o Shas já disse que vai recomendar Bibi enquanto Lieberman não disse quem ia recomendar."
É essa incógnita que dá poder negocial ao líder da extrema-direita.
Já Yossi Verter, comentador político do diário Ha'aretz, acha que Livni nem tem hipótese de ser primeiro-ministro. "Bibi será primeiro-ministro, num governo à direita ou num governo com o Kadima. Livni não tem suficientes deputados que a recomendem."
Parece claro que não terá o apoio dos partidos árabes. Ontem o líder do Ta'al, Ahmad Tibi, disse que não vai recomendar Livni nem integrará uma coligação com ela, "tendo em conta comentários sobre os árabes feitos no passado".
Quanto a Lieberman, entre encontros com Livni e Bibi, vangloriou-se de ter "determinado a agenda destas eleições", declarou que queria um governo de direita e falou sobre o Hamas: "Não teremos negociações directas ou indirectas com eles nem um cessar-fogo. Não importa que tipo de governo será formado; se estivermos nele, a derrota do Hamas será o principal objectivo."
"Pode tentar, Livni e Barak tentaram muito e falharam", ironiza Ali Jirbawi, analista palestiniano da Universidade de Birzeit. "Se Lieberman quer mesmo derrotar o Hamas, então deve haver um processo de paz a sério, não apenas conversa e conversa."
Do lado palestiniano, muita gente viu estas eleições em Israel como uma escolha entre a direita e a direita, e ninguém parece acreditar que faça muita diferença um governo liderado por Bibi ou por Livni.
"Vai ser uma continuação do que aconteceu até agora", resume Jirbawi. "Negociámos com Livni e nada aconteceu. Não há quaisquer expectativas do lado palestiniano. Passámos mais de 15 anos a falar. Se eles agora têm alguma coisa para oferecer, digam. Se não, podem ir de guerra em guerra."
Público, Destaque, página 3, em 12/02/2009.
Os trabalhistas podem desaparecer e o sistema político continua a degradar-se
12.02.2009, Jorge Almeida Fernandes
O analista Eitan Haber escreveu no Yedioth Ahronoth que o sonho de Bibi seria reunir inicialmente uma maioria parlamentar com a direita nacionalista para depois propor, em posição de força, uma aliança a Livni e Barak, realizando o sonho do Likud: "esmagar o Kadima e dividir o Labour". Com ele a primeiro-ministro, evidentemente.
Nas próximas semanas, os políticos israelitas darão provas de incomensurável imaginação. O título do artigo de Haber encerra um augúrio: "Receita para desastre político."
Prossegue o estilhaçamento do quadro partidário. Começou com a erosão dos dois grandes partidos, o Labour e o Likud, que no início da década de 1980 tinham 95 dos 120 deputados. Multiplicaram-se depois as listas que representam comunidades étnico-religiosas ou meras facções pessoais. Nesta eleição nenhum dos grandes partidos chega sequer aos 30 lugares. Estão condenados a fazer coligações disfuncionais, em que os "pequenos" dispõem de um temível poder de chantagem, paralisando os governos ou fazendo-os cair. Não há lideranças fortes ou capazes de "coragem política". Yitzhak Rabin, à esquerda, e Ariel Sharon, à direita, foram as excepções nas últimas duas décadas.
Vigora um sistema de representação proporcional puro, em círculo nacional, bastando a uma lista somar dois por cento para estar representada no Knesset (Parlamento). Este sistema foi instituído na fundação do Estado, para representar todas as correntes do mosaico herdado da diáspora, à espera de uma homogeneização nacional. Mas a crescente "tribalização" da sociedade, patente desde os anos 1970, e a erosão dos grandes partidos conduziram à "balcanização".
Na impossibilidade de revisão da lei eleitoral, Sharon tentou no fim de 2005 subverter o mapa partidário, fundando um grande partido de centro, Kadima, que seria o eixo da vida política, podendo escolher alianças à esquerda ou à direita. Também falhou: o próximo governo será "escolhido" pelo kingmaker Lieberman e pelos ultra-religiosos do Shas.
Aceitam-se apostas sobre a data das próximas eleições antecipadas.
2. Um dos mais fortes sinais da degradação do sistema é a queda dos trabalhistas. Foram sempre o primeiro ou o segundo partido. Agora são o quarto, com 10 por cento dos votos. Não é apenas uma derrota eleitoral, é uma ameaça de desaparecimento. Pouco vale aos seus dirigentes a consolação de uma parte dos eleitores tradicionais terem escolhido o "voto útil" no Kadima. Essa escolha é, em si mesmo, um preocupante sinal para o partido.
Em Junho passado, o jornalista Daniel Ben-Simon trocou o seu posto no diário Ha'aretz por um lugar na direcção do Labour, visando bater-se pela recuperação da sua identidade ideológica. Hoje, reconhece o fracasso. A pobreza começa a ser um problema sério em Israel. A agenda política tem de combinar a segurança e o social. Ora, quando Ben-Simon vai falar em público apenas lhe fazem perguntas sobre os rockets do Hamas. "Tínhamos preparado uma lista com uma identidade social-democrata bem marcada. Depois, a guerra de Gaza varreu tudo."
O Labour é o herdeiro directo da Mapai, fundado por David Ben-Gurion em 1930, com duas bandeiras, a nacionalista e a socialista. Foi o partido que ganhou a independência e construiu o Estado. Dominou durante décadas os sindicatos. Hoje, o Labour é visto como um "partido burguês" e o "proletariado" vota maioritariamente no Likud.
A ruptura começou com a emancipação política dos sefarditas, que denunciaram a sua marginalização na sociedade e no Estado por parte da elite askhenaze. Foi o seu voto que levou, pela primeira vez, a direita ao poder, quando o Likud venceu as eleições de 1977.
Na derrota de ontem, Ehud Barak tem uma responsabilidade pessoal. Em grande medida, o ataque a Gaza foi determinado por razões eleitorais: anular a vantagem de Netanyahu nas sondagens. Barak começou efectivamente por ser beneficiado. No fim, a guerra e o pânico securitário terão em particular favorecido Lieberman, cuja plataforma política assenta na xenofobia em relação aos israelitas árabes.
Ou seja, Barak contribuiu para que as eleições fossem completamente centradas na exacerbação do tema da segurança, não passando para o eleitorado uma mensagem distinta. Foi também Barak quem convenceu o partido a manter-se na coligação de Ehud Olmert, em 2007, após a sua condenação pelos erros cometidos na guerra do Líbano em 2006, de modo a ocupar a pasta da Defesa.
Ontem, deu a entender que preferia reconstruir o Labour na oposição. É consequente: pretendia ter 20 deputados para ser ministro da Defesa de Bibi. Com 13, é difícil.
O problema de fundo do Labour não é apenas ter perdido a identidade social-democrata. Também foi perdendo, depois do fracasso de Camp David (2000), a sua autonomia no conflito palestiniano. Que o distingue do Kadima? Nada ou muito pouco, responde no Ha'aretz o analista Aluf Benn. A conclusão destas eleições, escreve, é que "o Kadima e o Labour se devem fundir e actuar como uma única facção no Knesset".
Por um lado, o Labour de Barak está em progressiva queda "e já não há razão para a existência separada do partido". Por outro, "combinando moderação política e firmeza na segurança", formariam um bloco de 40 deputados, o maior do parlamento, que se tornaria no "centro do sistema político", o estabilizaria e permitiria "salvar o processo de paz".
O Labour tem razões para temer o pior.
Pesquisa FAPESP online (Fev/2009)
Entrevista
Professor da Universidade da Califórnia revisita raízes do conflito árabe-israelense
Carlos Haag
Edição Impressa 156 - Fevereiro 2009
Ao afirmar que “a guerra é a continuação da política por outros meios”, Clausewitz não imaginou que seria possível inverter-se a ordem dos fatores para fazer da guerra uma forma de política. Para o cientista político Zeev Maoz, diretor do Programa de Relações Internacionais da Universidade da Califórnia, Davis, e autor de Defending the holy land: a critical analysis of Israel’s security and foreign policy, essa tem sido a forma como Israel vem conduzindo a sua política externa. “Israel não tem uma política de paz, apenas uma política militar. Isso vale tanto para as negociações com os Estados Árabes (ou seja, a total falta de resposta às iniciativas sauditas e às resoluções da Liga Árabe de 2002 e 2007) como em suas relações com os palestinos. Mas o fato de ser um Estado militarista não impede que Israel seja, também, uma democracia, uma sociedade civil altamente desenvolvida. Uma coisa não invalida a outra”, explica Maoz. Tendo servido como soldado e oficial em várias guerras israelenses, inclusive as do Yom Kippur e a do Líbano, o professor pesquisa a fundo, e sem preconceitos, o que chama de tratamento “acrítico” de muitos em Israel sobre as bases da doutrina de segurança nacional do país e de como essa, ao apresentar muitos equívocos, precisaria ser reavaliada. >>> Leia mais, clique aqui.
Continuação:
Veja mais:
12/02/2009
- Israel x Gaza x Oriente Médio (300) .... Corrida por alianças em Israel
- Israel x Gaza x Oriente Médio (299) .... Eleição joga Israel em novo impasse político
- Israel x Gaza x Oriente Médio (298) .... Eleições em Israel: analistas veem resultado ruim para os EUA
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