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Rio de Janeiro, RJ, Brazil
Cláudia Andréa Prata Ferreira é Professora Titular de Literaturas Hebraica e Judaica e Cultura Judaica - do Setor de Língua e Literatura Hebraicas do Departamento de Letras Orientais e Eslavas da Faculdade de Letras da UFRJ.

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sexta-feira, 24 de abril de 2009

O Papel do Docente na Construção da Memória do Holocausto

BB Press Especial (24/04/2009) - bbpress@bnai-brith.org.br


O Papel do Docente na Construção da Memória do Holocausto

Marcelo Vieira Walsh (Mestre em Relações Internacionais)


Nesta semana, precisamente na noite do dia 20 de abril, recordamos o Iom Hashoah, data em que se presta uma justa homenagem aos mártires judeus dos anos 1930 e 1940, que foram aniquilados pelo império do terror nazista do Terceiro Reich. É a data da heróica revolta do Gueto de Varsóvia, iniciada em 1943, pelos Macabeus modernos; é o Dia da Recordação das Vítimas do Holocausto (em Hebraico, Shoah). Esta data se complementa com o “Dia Internacional em Honra às Vítimas do Holocausto”, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU), através da sua Assembléia Geral, e que se celebra anualmente no dia de 27 de janeiro, data de libertação do campo de extermínio de Auschwitz-Birkenau, na Polônia, pelo exército vermelho. Ambas as efemérides contêm um profundo significado e lição para os nossos dias do século XXI e servem como referências pedagógicas para os professores.


Afinal, qual o significado dessas datas para esse início do século XXI? O que elas têm a ensinar às novas gerações? Elas estariam restritas às comunidades judaicas pelo mundo? O que há de pedagógico nelas? E qual deverá ser o papel do docente no tocante à Memória da Shoah? Bem a propósito, cabe-nos refletir sobre as palavras de um dos mais notáveis historiadores britânicos e especialistas em Memória da Shoah, Martin Gilbert, ao abordar a Noite de Cristal (Kristallnacht), de 1938, episódio fabricado pelo regime nazista que destruiu mais de mil sinagogas na Alemanha:


A Kristallnacht ensinou, em retrospecto, uma lição histórica de que aquilo que começa como algo finito em matéria de destruição e limitado no tempo pode rapidamente evoluir para um monstro de extermínio em massa; que o mal tem gradações, mas também é um processo e pode mover-se suavemente, sem esforço, para um mal ainda maior. [1]


Primeiramente, não devemos esquecer que a tragédia da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), provocada pelo ímpio e execrável sistema político-ideológico totalitário, que foi o Nazismo, acarretou a morte de mais de 12 milhões de pessoas em campos de extermínios nazistas – sendo mais de seis milhões de judeus e mais de cinco milhões de não-judeus (entre doentes, lideranças católicas e evangélicas anti-nazistas, ciganos, homossexuais, opositores, intelectuais, etc). Muito embora tivesse havido duas salutares reações mundiais – a instituição dos tribunais militares para julgar crimes de guerra, de maneira especial, o de Nuremberg, em 1945; e a aprovação, por unanimidade, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, na III Seção Ordinária da Assembléia Geral da ONU (contando apenas com a abstenção de países socialistas), em 1948 – novas tragédias humanas não deixaram de se repetir: a ditadura de Josef Stálin (1928-1953), com os seus nefastos Gulags e KGB; a tirania implacável de Mao Tse-Tung (1949-1976), contra chineses opositores e tibetanos; as ditaduras de esquerda e de direita do Terceiro Mundo, que exterminaram militantes e civis inocentes. Enfim, a segunda metade do século XX, lamentavelmente, demonstrou que a humanidade ainda não aprendera as dramáticas lições da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).


Hannah Arendt (1906-1975)[2], notável filósofa política de sua época, intelectual judia alemã, constitui uma das maiores referências para o ensino. Em 1961, ela foi designada pela Revista New Yorker, para cobrir o julgamento do criminoso nazista Adolf Eichmann, responsável direto pelo planejamento sistemático da “Questão Final” (eufemismo do plano de aniquilamento físico, cultural, social e espiritual do povo judeu). Foi dela a autoria da expressão “banalidade do mal”. A pensadora, na sua privilegiada argúcia, afirma, referindo-se ao carrasco-chefe nazista, “alguém habituado a não pensar nas conseqüências dos seus atos” em nome do regime nazista do terror, medo e destruição. Enfim, as conseqüências dessa irreflexão foram terríveis para a Humanidade.


O longo século XXI, que, na ótica historiográfica do historiador Eric Hobsbawn[3], inicia-se com o desmoronamento do império soviético e o fim da Guerra Fria, em 1991, apresenta um vigoroso espírito de renovar de esperanças, de inquietações e de expectativas. Temos o renovar de esperanças quanto à difusão universais dos valores da Democracia, Direitos Humanos, Coexistência, Justiça, Liberdade, Igualdade e Fraternidade para países que experimentaram ou experimentam ainda regimes fechados. A forma fratricida como ocorreu o desmoronamento da antiga Iugoslávia (1990-1991), o Genocídio de Ruanda (1991) e os atentados terroristas do 11 de Setembro de 2001 são exemplos de assustadores conflitos internacionais, baseados num nacionalismo exacerbado, embates interétnicos e fundamentalismos religiosos. E expectativas de que novas conturbações possam abalar o sistema internacional - como o caso do atual regime totalitário teocrático do Irã, que patrocina a máquina de terror (Hezbollah e Hamas), promove o seu programa nuclear para fins militares e estimula o discurso de intolerância e de ódio antissemita do seu presidente, Mahamoud Ahmadinejad, negador sistemático da existência da Shoah e do legítimo direito de existência do Estado de Israel.


A Memória da Shoah – das vítimas, heróis e sobreviventes do Holocausto judeu – torna-se um imperativo de toda a Humanidade. Lembremos, primeiramente, que a História apresenta um profundo conteúdo pedagógico, no sentido de se evitar que novas tragédias se repitam e de se ensinar a combater todos os tipos de intolerância. A sociedade internacional tem o dever não só de recordar a tragédia singular do aniquilamento de mais de seis milhões de judeus (ou mais de 60% da população judaica da época); mas, o de educar às novas gerações na Cultura da Paz, Coexistência e Diálogo entre os todos os povos do mundo. O dever de também de estar vigilante às manifestações de intolerância – venham de indivíduos isolados, de gangues neo-nazistas, organizações racistas e antissemitas ou de governos intolerantes (como o do Irã e o do Sudão). E utilizando o Direito Internacional, combater e proporcionar uma resposta adequada e firme a toda e qualquer forma de intolerância religiosa, antissemitismo, racismo, xenofobia.


Retornemos à pergunta essencial: qual deve ser o papel do docente, face ao desafio universal da Memória da Shoah? Devemos referir ao papel do docente, desde das tenras gerações do Ensino fundamental até o nível do ensino superior. Augusto Cury[4], um entusiasta da análise sobre o imprescindível papel do professor na sociedade e da sua missão de formar as novas gerações, afirma que o professor fascinante transmite “sabedoria, sensibilidade, afetividade, serenidade, amor pela vida, capacidade de falar ao coração, de influenciar pessoas”. Ora, ensinar a Memória da Shoah, nessa perspectiva, presta-se não apenas a recordar a tragédia histórica da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), mas a cultivar o mais profundo Humanismo – e com ele os valores e ideais universais da Democracia, Direitos Humanos, Justiça, Paz, Coexistência e Fraternidade. O professor – tanto em sala de aula como em atividades extraclasses –, na qualidade de líder e formador de gerações, deverá ensinar às novas gerações o respeito, a recordação, o não-esquecimento e a lição imortal da Memória da Shoah. Manter acesa a Chama da Memória da Shoah é perpetuar a Chama da Vida!


[1] GILBERT, Martin. A Noite de Cristal – A Primeira Explosão de Ódio Nazista contra os Judeus. Rio de Janeiro: Ediouro, 2006, p.282.

[2] ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém. São Paulo: Cia das Letras, 2001.

[3] Vide HOBSBAWN, Eric. A Era dos Extremos. São Paulo: Cia das Letras, 1996.

[4] CURY, Augusto. Pais Brilhantes e Professores Fascinantes. 7ª ed.. Rio de Janeiro: Sextante, 2003,p72.


Marcelo Walsh - Bacharel em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (1992), possui mestrado em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (1997). Atualmente leciona na Escola Superior de Negócios e na Universidade Católica de Goiás. É pesquisador da linha de "Holocausto e Antissemitismo", do Laboratório de Estudos sobre Intolerância, da USP, coordenado pelo dr. Samuel Feldberg.


Dissertações e teses


Deutsche Welle (24/04/2009)


FSP online (24/04/2009)


Stratfor (24/04/2009)


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Israel Politik (20 a 23/04/2009)


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